Zen é vida. Portanto, comer é indispensável para o Zen. No que se refere ao ato de comer, devemos considerar três elementos: os ingredientes, o modo de fazer e a pessoa que come.
Nas receitas, no entanto, as medidas não são precisamente determinadas. O fundamental para quem vai cozinhar é a liberdade de criar e se expressar na execução de cada prato. A harmonia entre os sabores é algo que o cozinheiro deve buscar, liberto de receitas com valores exatos.
Se os seis sabores (amargo, azedo, doce, quente, salgado e suave) não estiverem em harmonia e à comida faltarem as três virtudes (suavidade, limpeza e formalidade), então a oferenda do Tenzo (monge cozinheiro) à congregação não estará completa.
Se o Sodô, o templo da meditação, é considerado essencial para a vida monástica, a cozinha é tida no mesmo nível de importância e também é considerada um templo, o Tenzoryo. Se no primeiro, alimenta-se a mente, no segundo alimenta-se o corpo. Para os budistas, um não existe sem o outro.
As refeições são realizadas sempre em silêncio. O trato com o Oryoki (conjunto de tigelas) segue um código sofisticado, que chama a atenção do praticante para aquilo que está fazendo no momento. Os monges budistas seguem uma seqüência ritualizada de procedimentos, com atenção voltada a cada detalhe. Cada um deles leva consigo seu próprio conjunto de utensílios, embrulhado em uma trouxinha de pano. São feitas preces e reverências antes, durante e ao término da refeição, quando as tigelas e talheres – que foram delicadamente lavados à mesa – voltam a ser envolvidos na toalhinha de pano.
Os gestos precisos e detalhes harmoniosamente coreografados exigem atenção máxima. Alimenta-se usando todos os sentidos, degustando a variedade de sabores, temperaturas, a fragrância que exala do prato, o movimento da mastigação.
Oryoki (do japonês ooryooky) significa “tigela”, mais precisamente, uma tigela do tamanho do estômago. A relação entre tigela e estômago já transmite a idéia de equilíbrio, de se alimentar do necessário e na quantidade que o corpo precisa – nem mais, nem menos.
Monja Coen ressalta que “o oryoki é uma prática meditativa na medida em que estou comendo com plena atenção. Estou em silêncio, sentindo a fragrância e o sabor dos alimentos. Percebi a rede de interdependência de todas as formas de vida”.
Todos os procedimentos são realizados com as duas mãos. Não se pega uma tigelinha com uma das mãos, enquanto a outra manuseia os hashis, por exemplo. O foco tem de estar totalmente voltado para o que se está fazendo, o que naturalmente demanda mais atenção. “Isso tudo é treino de meditação”, diz a monja. Por mais complexa que pareça, a prática do oryoki traz um benefício simples: o reencontro com a paz no momento da refeição. A idéia é deixar tudo o que não for inerente à alimentação bem longe da mesa.